quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Leitura Poética não é Sarau


O paulista Marcelo Montenegro é dono de uma voz que não cabe em seus versos. Por isso, é um dos poetas na linha de frente da leitura poética – movimento oral hoje febre, mas iniciado nos anos 70, no Rio de Janeiro, pelo cinqüentão Chacal. Não se trata de sarau. Aquelas reuniões chatas, cheirando a incenso, gente sem banho e cerveja quente, e em cima disso seres emocionados lendo “puisia”.

Nada disso, aqui a emoção é a ponta de faca, vasculhando a lata de lixo.

Guardando a tralha/
Repara/
Há sempre alguém/
Guardando a tralha. Tremendo a foto. /
Aprimorando a tara.

Há um deus maluco embaralhando / as cartas. Uma banana quase preta/
Na fruteira. E o último gole/
Da cerveja em lata.

O negócio de Marcelo é observar as miudezas do cotidiano, essas coisas para as quais ninguém dá atenção. Ele recolhe dessas migalhas uma humanidade difusa, às vezes engraçada, às vezes melancólica.

De tudo talvez, permaneça / o que significa. O que/ não interessa. De tudo/ quem sabe fique aquilo/ que passa. Um gosto de aflição/ Um gosto de obturação na boca. / Uma piada / um provérbio / um buquê de presságios / Sons de gota na torneira da pia / De tudo talvez restem / bêbadas anotações / no guardanapo / E uma música que não toca no rádio.

Não é raro ver pessoas se debulhando de risos ou de lágrimas nas apresentações de Marcelo, um legítimo show de Blues.

Trechos retirados do encarte Reveal da revista Trip.

marcelomontenegro.blog.uol.com.br


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