quarta-feira, 12 de novembro de 2008

Not So Easy

O que esperar de um presidente americano?

Eu venho vendo nos últimos dias uma série de artigos e entrevistas em nossos canais de notícias, na mídia impressa e na internet, todos discutindo (e especulando) sobre o que esperar do presidente eleito americano.

Invariavelmente chega-se a determinado momento onde o entrevistador faz a pergunta: E o Brasil? O Governo Obama será bom ou ruim para o Brasil? Segue uma sempre igual ladainha sobre protecionismo e sobre o peso da América Latina no cenário político e econômico.

Eu não considero que essas preocupações sejam de todo impertinentes, é natural que ao se dar conta da significância do fim da era Bush se queira saber o que esperar daqui por diante, uma vez que um novo cenário político nos EUA impactará a vida de todos nesse planeta.

Contudo, eu penso que poucos de nós realmente pararam para pensar de forma crítica (e não meramente repetirmos o que “aprendemos” com a mídia) sobre como e porque George W. Bush foi tão ruim, como e porque Obama pode significar mudança real, e como e porque a política americana afeta o nosso dia a dia aqui no sul do mundo.

Eu acredito que para começarmos a buscar essas respostas temos que abrir nossas mentes para algo que é mais do que um exercício mental, mas nesse momento uma necessidade – uma mudança de mentalidade que nos permita de fato aceitarmos que acima de nossos subsistemas econômico e político reina um sistema maior – a biosfera.

Biosfera é o conjunto de todos os ecossistemas
da Terra. Incluem-se na biosfera todos os organismos vivos que vivem no planeta, embora o conceito seja geralmente alargado para incluir também os seus habitats.


O homem, como ser vivo, faz parte da biosfera, modificando-a positiva ou negativamente.

Os seres vivos dependem uns dos outros e mantêm relações específicas com o meio ambiente. Com exceção do homem, que consegue se fixar e viver em quase todos os lugares do planeta, devido ao alto grau de adaptabilidade que lhe é natural, cada ser vivo tem um ambiente em que se adapta melhor e que, sendo modificado, pode afetar o ecossistema. Por isso, o homem tem uma responsabilidade acrescida na saúde da biosfera..


Uma dos grandes erros de concepção de parte do movimento ambientalista é conceber que a destruição da biosfera levará a destruição do planeta. O planeta vai sobreviver enquanto quem está em risco de extinção é a raça humana, o que também não seria anormal se levarmos em conta que 99,9% das espécies que já habitaram esse planeta não mais existem. A tragédia é que somos uma espécie extremamente nova, apesar do grau da infecção que causamos à Terra, chegamos relativamente tarde ao planeta.( Se a terra houvesse surgido no dia 1º de janeiro o Homem teria surgido às 23:59:59 do dia 31 de dezembro.)

Há 400 milhões de séculos uma célula se formou desenvolvendo consigo um gene que é o código para tudo o que somos hoje. Fazem parte do organismo que chamamos de Homem Contemporâneo, o Homo Sapiens, cerca de cem trilhões de células, as quais 90% não são na verdade humanas – são fungos, bactérias e outros microrganismos.

Somos um universo dentro de um universo e dentro de nós está a história da nossa vida na terra, desde a primeira célula original até esse momento. Neste mesmo momento , dentro de cada um de nossos corpos, cerca de seis septilhões (seis seguido de vinte e quatro zeros ) de atividades estão acontecendo ao mesmo tempo. Nos próximos dez segundos mais coisas acontecerão em seu corpo do que em toda a história conhecida dos planetas, das estrelas e asteróides.

A isso chamamos de vida.

Mais do que um conjunto de felizes coincidências cada um de nós é um sistema que luta a cada segundo por sua sobrevivência, comandados por aquilo que chamamos de mente humana.

Foi a mente humana que, ao desenvolver a consciência e logo em seguida inventar o conceito de futuro, nos permitiu a sobreviver e eventualmente dominar as outras espécies. Esse conceito nos permitiu entender que nossas ações presentes poderiam afetar nossa situação mais adiante, e criou-se o que então chamamos de escolha. Reconhecemos onde estão as oportunidades e ameaças e escolhemos de acordo. Assim sobrevivemos até hoje.

O problema é que essa mesma mente deu-nos a falsa impressão de que somos desconectados dos demais sistemas que nos circundam, um distúrbio de raciocínio que nos faz pensar que somos separados da natureza ( a qual tentamos dominar ), enquanto na verdade mais do que fazermos parte dela, nós somos natureza.

Conquistar e dominar a natureza é a premissa essencial do sistema em que vivemos.

Esse processo de desconexão vem se intensificando nos últimos milhares de anos e nos últimos duzentos anos esse processo acelerou-se bruscamente.

Um elemento contribuiu essencialmente para que isso ocorresse.

Por toda a história humana, os seres humanos viveram com a quantidade de energia que dispunham, isto é, com a quantidade de sol que tinham. O sol batia nos campos, os campos cultivavam plantas, as plantas faziam celulose, os animais comiam celulose, nós comíamos as plantas e os animais, usávamos roupas e plantas feitas de vegetais e animais, nos transportávamos por meio de animais. Vivíamos enfim com o sol que tínhamos – o sol que chegava à Terra em um ano era o máximo de energia que podíamos usar naquele ano.

Assim, até alguns milhares de anos atrás nossa população e manteve sempre abaixo de um bilhão.
Foi então que começamos a descobrir pequenas bolsas de energia solar armazenadas na Terra, principalmente na forma de carvão e óleo.

Isto permitiu que atingíssemos a marca de um bilhão de habitantes pela primeira vez na história humana em 1800. Levou-nos apenas 130 anos até que atingíssemos 2 bilhões em 1930, e apenas 30 anos para que atingíssemos 3 bilhões em 1960. A população atual é de 6,4 bilhões de habitantes.

O motivo de termos conseguido esse crescimento demográfico exponencial é porque produzimos comida e vestuário com essas reservas de luz do sol armazenadas na Terra há 300 ou 400 milhões de anos.

Sem tecnologia, se tivéssemos que viver hoje com o sol que incide na terra tão somente, o planeta não poderia abrigar muito mais do que meio bilhão de pessoas.

O que aconteceu é que nos últimos milhares de anos nos tornamos bons alquimistas, transformando o carbono e consequentemente o petróleo no alicerce de todo nosso sistema, de tudo o que consumimos.

Toda complexidade de nossos problemas políticos e econômicos se resume no fato que esse crescimento exponencial fez com que hoje sejamos gente demais usando recursos de menos, e de forma bastante desigual.

Os EUA emprestam do mundo 800 bilhões de dólares por ano para financiar o seu excesso de consumo, emitindo mais de um bilhão de dólares em notas promissórias e títulos da dívida por dia. Um terço desse déficit, cerca de 250 bilhões, é diretamente resultado da importação de óleo. A Exxon-Mobile é hoje maior do que todas as companhias de automóveis do mundo somadas.

Vivemos hoje uma convergência de crises. Desde a criação da corporação dentro do sistema capitalista até a sua transformação na instituição dominante da nossa era vivemos algumas crises, em parte decorrentes do que talvez possamos chamar de institucionalização da ganância. Porém o que vivemos hoje é mais do que uma crise do sistema econômico ou mesmo uma crise política generalizada como foram as guerras mundiais.

O que está em jogo nesse momento é a sobrevivência de um sistema de dependência em combustíveis fósseis que foi concebido há mais de duzentos anos, com a invenção da máquina a vapor e a conseqüente revolução industrial.

Embora a corrida tecnológica tenha dominado boa parte do século passado, talvez só agora a tecnologia se coloca como não somente uma aliada do poder econômico, mas como a única solução para a nossa sobrevivência enquanto espécie. Talvez esse momento seja, enfim, a revolução tecnológica.

Um revolução tecnológica envolve a utilização eficiente da energia solar e dos ventos, a concepção de formas alternativas de transporte, uma redefinição dos métodos de produção e acima de tudo uma economia sustentável.

Infelizmente, talvez o maior fracasso ou canalhice ( dependendo do ponto de vista ) do governo Bush ( e em menor escala de todos os governos americanos nas últimas décadas) tenha sido a sua inabilidade (ou falta de vontade) em transformar essas revolução tecnológica em lei.

Isso se dá mais do que em parte devido ao fato que os EUA possuem uma constituição que autoriza algumas corporações a tomar decisões que só beneficiam uma minoria. Essa constituição permitiu os EUA se tornarem a potência que são, mas a partir de meados do século passado, quando começamos a entender as conseqüências desse sistema, ela passou a se tornar uma constituição questionável, e eu penso que os líderes que dela se utilizaram para favorecer a indústria do petróleo foram mais do que irresponsáveis – foram criminosos.

Há dinheiro demais na política.

Thomas Jefferson, o terceiro presidente americano, advertiu em 1808 para a necessidade de se rever a constituição a cada geração. Ou seja, os fundadores dos EUA não poderiam antever em 1776 os problemas que estamos hoje enfrentando.

Durante os anos 60 e 70 houve nos EUA uma união entre democratas e republicanos para tratar de algumas questões que são hoje urgentes. Nesse período foram redigidos a Lei Política Nacional Ambiental, A Lei do Ar Puro, a Lei da Água Limpa, o Tratado das Espécies em Extinção. Todo esse esforço foi gradualmente erodindo pelas políticas de Reagan, Bush I, e por fim nocauteadas nos últimos oito anos.

Para ilustrar - o Chefe de Estado Maior do Conselho de Qualidade Ambiental dos EUA do governo Bush, Phil Cooney, não é um cientista, mas sim um advogado que trabalhou a vida toda como lobista do Instituto Nacional do Petróleo antes de ir parar na Casa Branca.

O que então esperar de um Governo Obama?

Esperamos um governo que entenda que o sistema econômico é um subsistema, dentro de um sistema maior – a biosfera.

Que entenda que o sistema econômico é atualmente concebido para crescer e se expandir, enquanto a biosfera não cresce – tudo nela busca equilíbrio e manutenção. Isso faz com que a economia abuse da biosfera, e acabe por fazer menos favorável a vida humana.

Em suma, um governo que lidere o mundo nesse novo século deve considerar que a qualidade de vida deve sobrepor o lucro como finalidade, e deve enxergar o lucro como meio.

Um governo que lidere o mundo nesse novo século tem uma tarefa nada pequena – liderar a reinvenção do sistema industrial.

Hoje, para cada quilo do que é produzido são gerados 32 quilos de lixo.

Um governo que lidere deve se inspirar na natureza e seus sistemas sustentáveis, onde o que é lixo para um vira alimento para outro.

Os problemas que estamos enfrentando não são um problema tecnológico, um problema de excesso de CO2 na atmosfera, um problema de aquecimento global e não são um problema de lixo. Todas essas coisas são sintomas.

O problema é a nossa mentalidade. O problema é fundamentalmente cultural. Foi na raiz de nossa cultura que a doença se instalou.

Quando minha sobrinha de um ano e nove meses chegar à universidade, ela terá assistido cerca de 500 bilhões de comerciais e será capaz de identificar milhares de logotipos e marcas. Ela nasceu num mundo onde a maioria das pessoas passa o dia trabalhando para poder comprar mais e onde existe uma consciência crescente de que precisamos manter a economia global.

Antes mesmo da atual crise econômica, a economia virou o assunto principal na mídia, suplantando mesmo o esporte, salvo quando ocorrem algumas tragédias. A preocupação principal dos governos, seja na China, no Brasil ou em Israel, é dar ao povo o poder de consumo.

Uma vez que passamos a consumir símbolos mais do que produtos em si, se torna praticamente impossível reverter essa situação. Um símbolo tem um poder sutil que lida com o nosso inconsciente. Para mudar a consciência é preciso mudar o objeto de desejo para chegar à raiz do problema, a idéia da expansão ilimitada.

Essa é uma transformação cultural.

Vivemos numa sociedade que adquire conhecimento através de mídia, e não mais diretamente da Terra. Não temos mais contato direto com nossas fontes de sobrevivência e não mais aprendemos com nossas próprias experiências.

Somos como astronautas flutuando, desconectados, dependentes de informações que nos chegam de muito longe, filtradas e interpretadas por pessoas com histórias muito diferentes das nossas.

Mentalmente dormentes, não vemos a beleza do mundo, e procuramos assim por substitutos.

“Você não pode jamais ter o suficiente daquilo que você não quer de fato.”
Eric Hoffer

As pessoas precisam aceitar individualmente o custo dessa transição, e a grande maioria precisa ser conscientizada da real necessidade de mudança. Essa maioria acorda de manhã, se preocupa em ir trabalhar, levar os filhos à escola, programar as suas férias e assim se passam dias meses semanas e anos.

Essa é uma escala de pensamento muito estreita para lidar com os problemas que temos que enfrentar. Precisamos nos dar conta de como a não sustentabilidade do sistema em que vivemos afeta nossa vida cada vez mais.

Para viver de forma sustentável, não precisamos voltar a ir morar nas florestas.

Podemos, contudo nos inspirar na natureza para redefinir a forma como vamos utilizar a tecnologia que já dispomos, aliando o nosso conhecimento cientifico e tecnológico ao nosso conhecimento cultural.


Esses são os desafios de uma nova liderança global. E o que se espera de uma presidência da nação que almeja ser líder no planeta é que ela lidere essa transformação em direção a um estilo de vida sustentável, que vise o equilíbrio e não a expansão e dominação. Esperamos um governo que seja um governo global, cujas ações visem o bem de todo o planeta.

Não acredito que esse governo global vá se formar em um mandato ou dois. Mas essa é a visão daquilo que o mundo deva almejar, e pelo qual devamos lutar. Esses são os valores que devemos defender.

Compilação, redação e opinião: Drigo

Fontes:
http://11thhouraction.com/
http://www.change.gov/
Wikipedia






Nenhum comentário: